sábado, 13 de dezembro de 2014

Rosa Angelical

Mulher da minha vida, não chora.
A vida tem sido dura
A força mora em você.
Quando seu ventre era meu paraíso
Suas lágrimas o preenchiam em rios de mel
Eu mergulhava com pontapés no céu
Você me confortava quando seu mundo fluía em pedaços.
Vida e morte num mesmo compasso
Você teve de chorar o choro em pares
A dor da perda, a dor do parto,
Eu estava lá com você
O filho no lugar da irmã.
Já choramos demais,
Segure a minha mão, mãe
Você tem o dom da vida
Sabe de cor a canção
Cante, cante, não desencante
A sua irreversível fé na esperança
Mãe, que faz das tripas o coração
Rosa angelical, Rosângela.
Mãe que foi mãe órfã
Que teve de conhecer a morte
Aos treze, sem misericórdia
Que sabe que falta que faz um colo de mãe.
Talvez por isso, tão exagero
Em nos compensar o que lhe faltou cedo...
Mas eu sou parte de você, me chame
Eu estou aqui com você.
Seu filho, que ninguém melhor compreende
Conhece... E por isso tem a força
De me desmontar em pedacinhos
De me fortalecer os méritos
Que nos fazem imperfeitos e nos completam.
Liberdade se conquista, não se ganha
Sei que você é quem sempre posso confiar
À hora de emergir meus jardins de infância.
O amanhã há de ser alegria
A vida ainda é esperança
Suas lágrimas deixarão apenas mais belas
O frescor coberto das manhãs.
Mas se acaso a tristeza insurgir
E sozinha estiver a resistir
Conte comigo e estarei sempre aqui, mãe
Seu irmão, sua proteção, seu amigo,
A sua eterna criança.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Do Abismo

Vivo em busca de um equilíbrio
na ladeira de uma existência
pérfida de compassos leves,
o abismo beira nos meus passos
o abismo dança nos meus pés.
Encaro o abismo de soslaio
seus tentáculos invisíveis
procuram meu ombro e pescoço
me convida para encontrá-lo
sua voz muda lá do fundo.
...Sinto sua respiração...
Bufa tão viva em minhas costas.
"vem fervor vem ver e volver
tão belo olhar do limiar
tão belas pedras pontiagudas"
parecem dizer seus sussurros.
O peso do mundo não diz
nem me pergunta, corrobora.
Fito esse abismo, ele devolve
seu olhar lá dentro de mim.
Silêncio. Vazio e reparo.
Infiro:
é chegado o tempo?

Você que tem a segurança
tal qual princípio do equilíbrio,
que não oscila e nada arrisca,
que paga em dia seu seguro
de um buraco de sete palmos
apenas; raso, protegido
fixo sob copas e troncos
retorcendo interrogação,
não pode saber da alegria
estonteante de viver
no limite da existência
e na margem da morte última.

Já, quando muito não demora
do abismo há de se encontrar
uma voraz vida profunda.
E desses sussurros nas costas,
asas para poder voar.
Do intenso perigo de queda
galgar o real equilíbrio.
Empregar a força motriz
- para tocar os céus e o sol -
do inquietante peso do mundo.
Porque o autêntico da vida
é saber que imensa é a lágrima
porque maior se fez o riso,
é entender que da tristeza
se extrai os melhores sorrisos,
é entremear os opostos
e abarcar ambas as metades,
é persistir, reafirmar
o desmanchar e edificar
do qual chamamos de existir.

O abismo beira nos seus passos
O abismo dança nos seus pés.

domingo, 28 de outubro de 2012

Canções do Exílio

Por minha terra ter palmeiras
onde canta o sabiá,
que minha terra tem palmares
onde gorjeia o mar.

Por minha terra ter primores
que tais não encontro cá,
que cantam aves invisíveis
nas palmeiras que não há.

Por nossos bosques ter mais vida
nossa vida mais amores,
que me ponho a escrever
com letras de macarrão.

Por nosso céu ter mais estrelas
nossas várzeas ter mais flores,
que minha terra tem macieiras
da Califórnia
onde cantam gaturamos
de Veneza.

Por não permitir Deus que eu morra
sem que desfrute os primores,
que nossas frutas são mais gostosas
e custam cem mil réis a dúzia.

Por minha terra ter palmeiras
ouro terra amor e rosas,
que minha terra tem gaiolas
onde pia o brasileiro. 

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Um Poema Lembrando Pessoa

Quem que disse que fazer poema
é por pra fora aquilo que sente?

Se as leis da comunicação dessem
ao coração tal libertinagem
qualquer sapo seria poeta
qualquer pessoa seria rã.

Mas o poeta, que é homem, longe
da beira do rio mas no meio
da cantiga faz o seu poema
pondo na chama do sol o círculo

Como quem corteja um inimigo
ele faz da dor um fingimento
Como o ébrio que busca equilíbrio
ele diz o que deveras sente.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

A Deus Adeus

Há violência no gozo
Há prazer na dor
Há muito amor no ódio
Há ódio no amor 
Há canto no desencanto
Há Leda na ausência
Há sede no pranto 
E há indecência na decência
Há amor no adultério
Há apatia na separação
Há ironia na tragédia
Há drama no folião
Há noite em todo dia
Há solidão na praça 7
Há escolha no suicídio
Há antítese pra toda tese
Há morte no que não há mais
Há eternidade na morte
Só em vida é que se morre
Há rima no paradoxo.